sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Qual O Reverso Da Medalha?

 
                                           "Cemitério da minha terra,
                                             Paredes a branquejar;
                                             Que bom será lá dormir
                                             Um bom sonho sonhar!..."
                                             Florbela Espanca

Não sei quem é mais insistente e impertinente, se a vida ou a morte. Haja o que houver as manhãs sempre chegam imponentes , sem pedir licença queimando nossas faces, chocando nossos olhos , mostrando as minhas e as tuas vergonhas, batendo á janela persistentemente e invadindo tudo.
A morte por sua vez está ali, bem ali , é uma espreitando a outra . De fato, uma é o reverso da outra`, mas qual o reverso, não sabemos. A cada vida chegando temos um instante que se esvai, que morre , mesmo que seja um único instante , ele já foi .
A cada dia nos confrontamos com a morte , mas também com a vida e toda a sua capacidade opressiva e esmagadora.Não seria também ela uma morte em si.a cada suspiro , seja de alívio,seja de pesar, deparamo-nos com a vida e a morte e ambas podem aliviar e oprimir .
 Cada tempo e momento é a vida chegando com a morte carregada em suas costas , ou seria a morte carregando a vida.?qual seria, então o fim e o início? Como dizer que uma é bela e a outra nefasta?
O sentido da morte seria mesmo o de fazer morrer, causar dor e sofrimento , humilhar ? Não seria estes , muitas vezes,elementos da própria vida?
Sendo a certeza da vida , a morte , não seria a vida a morte a cada instante? O que a diferencia então da morte , se ela a carrega em sua essência. Assim,a vida seria  até mais massacrante do que a própria morte , tendo esta como ponto final de seu caminho, afora as inúmeras mortes diárias, perdas diversas.
Se a morte vem de fazer,tornar , portar e levar , não seriam estes verbos o próprio sentido da vida...
A vida , na verdade,pode ser uma mortalha , e em tempos idos , mortos portanto, e vivos mais do que nunca , o corpo era revestido por uma mortalha antes de ser dado a terra , mas a terra não seria a própria fonte da vida...
O que dizer das fatalidades que sempre surpreendem na virada da página do livro, na próxima esquina.
Fatal é o que causa a morte , " sentença divina" , que tem suas origens na fala , buscamos a todo momento, esperamos que nos digam algo através dos homens ou através de Deus , sempre esperamos pela palavra , mesmo a final.
Mortificar tem o sentido de impor sofrimento, esta não seria uma faceta da vida, impor-nos sofrimento sempre e aprendizado, consequentemente. Até mesmo nos nascimentos , sinônimo maior de vida, temos a dor , o desconforto, o medo , a tal dor de parir, a dor de gerar.
Morte, mortalha, fatalidade, humilhação , mortandade , massacre encontram-se na vida , no "vidar" , pois a vida é em si um massacre diuturno, de sonhos, de realidades, basta enxergar, basta abrir as janelas e portas, basta acender a luz, basta querer ver.
A vida faz sofrer e entorpece , nos castigando , é uma verdadeira expiação, mas tudo isto é atribuído historicamente a morte.
Assim, vida e morte interagem todo o tempo, confundem-se e a depender de cada um , e de cada momento, uma ou outra pode ser alívio ou pesar , massacre ou renascimento, esperança sempre, tudo o que sobrou da caixa de Pandora .
Diante deste entrelaçamento , esta teia entre vida e morte , não deveria esta  ser retratada como uma figura esquelética vestida de manta negra com capuz e portando uma foice , como o macabro e aterrorizador, imagem criada pelos ocidentais , sempre divisando, equivocadamente, o bem e o mal, mas sim como uma bela senhora altiva e terna, elegantemente vestida de preto, cor que amo , que acolhe e afaga , que leva a nós, guerreiros, ao merecido descanso.
"(...) Morte é o fim da vida, e toda a gente teme isso, só a Morte é temida pela Vida, e as duas reflectem-se em cada uma (...)" Oscar Wilde