Inquestionavelmente o direito é um dos mais poderosos instrumentos de manipulação, posto que, impõe, através da pretensa legalidade, a utopia de que cada um terá o que é seu.
Se tal divisão tem como base a legalidade, os insatisfeitos terminam por aceitar, de bom grado, as migalhas que lhe são dadas, pois são migalhas impostas ou permitidas pela lei, daí a manipulação, se é legal não adianta mais contrariar , é melhor aceitar o que a lei determinar , ou seja, “ recebi o que me cabia, portanto o que merecia”.
Assim, as migalhas impostas ou permitidas descem “goela abaixo” travestida de banquete.
O Positivismo tem suas bases na cega observância às leis, mas esquecem que a lei maior, a Constituição, deve nortear as demais, ou melhor, os princípios devem nortear todos os aplicadores do direito.
O Brasil, inquestionavelmente, vem subindo os degraus do desenvolvimento, lentamente,sobe degrau por degrau,mas o topo está longe, bem longe, e é quase inatingível, mas um país que pretende subir tais degraus não deve se dar ao luxo de ignorar os seus princípios constitucionais, seus princípios de vida.
O Direito é repleto de dicotomias, sempre estamos entre dois senhores, entre Deus e o Diabo, entre o bem e o mal, entre o Justo e a Lei, e neste cenário, não pretendo fazer uma equivalência entre a Lei e o mal ,lei que é , por vezes, perversa ,pois se coloca , muitas vezes, entre nós e os princípios que devem nortear um Estado Democrático de Direito,transformando um arcabouço legal em calabouço nada legal.
Como, brilhantemente, afirmou Tércio Ferraz “Ser livre é estar no direito e, no entanto, o direito também nos oprime e nos tira a liberdade”.
Continuando com Tércio ele nos ensina que o estudo do direito é das mais difíceis atividades, necessitando não apenas acuidade, inteligência e preparo, mas também encantamento, intuição e espontaneidade e estes três requisitos são os mais complicados, os que raramente encontramos nos operadores do direito , embora entendamos que tal estudo deveria ser como o respirar, ou seja, natural .
Para a maioria, o direito transformara-se em equação matemática, em algo mecânico, em mero automatismo legal, sendo por demais apropriado o termo “operador do direito”, aquele que opera, lembramos portanto de mecanismo, de automação.
Assim, desde que me iniciei na Faculdade de Direito do Recife, “ Casa de Tobias”, sentando naqueles bancos , nos anfiteatros, olhando para aquelas paredes , tocando-as , que me encantei pelas inúmeras possibilidades que o direito me apresentava , e passei a tentar simplesmente respirá-lo . Pareceu-me fácil, mas não era , pois constantemente insistiam em colocar sacos no meu rosto impedindo-me de simplesmente respirar, e a cada tentativa a luta era a árdua , seja com todas as imposições, seja comigo mesma e meus próprios princípios de vida, a maioria incutidos.
O Direito tornou-se não um mistério a ser vivido, mas um problema a ser solucionado, um problema de princípios e da sociabilidade humana.
E assim, nos reportamos novamente a Tércio : “Introduzir-se ao estudo do direito é , pois entronizar-se num mundo fantástico de piedade e impiedade , de sublimação e de perversão , pois o direito pode ser sentido como uma prática virtuosa que se ao bom julgamento, mas também usado como instrumento para propósitos ocultos e inconfessáveis .Estudá-lo sem paixão é como sorver um vinho precioso apenas para saciar a sede .Mas estudá-lo sem interesse pelo domínio técnico , seus conceitos, seus princípios , é inebriar-se numa fantasia inconseqüente”,o que foi lido por mim, no início do curso, e que me orienta por toda a vida.
Passado o choque inicial pude constatar, enquanto profissional, que o positivismo me enjaulava, me colocava num quadrado,sem respiração , estava eu num balão de oxigênio e o ar já se esvaia.
Passei a procurar alternativas, que me possibilitassem respirar o direito, minimizar a manipulação que ele exercia, uma busca incessante não pela lei , simplesmente a lei , mas pelo JUSTO, pelo ideal de Justiça, a que diariamente tento aproximar-me , embora seja tarefa das mais difíceis, tanto quanto chegar ao topo da escadaria, mas na minha busca incessante , ao menos eu respirava e não confiscava o ar de ninguém.
Assim o rigor científico abria espaço a intuição, afastada a fria interpretação da lei.
Para tanto bastava, primordialmente, considerar o que o pai do positivismo já orientava, focar o topo da pirâmide, a Constituição e seus princípios, e depois a coragem em valer-se de uma via alternativa ao mecânico hábito de ler uma lei sem a profundidade devida, de interpretar uma lei sem invocar os princípios constitucionais, o terrível hábito de não pensar, de não ousar, de se conformar...
A nossa Constituição, gostem ou não, é garantista, visando, portanto, maximizar direitos e minimizar poderes, e é bom lembrar a máxima “ todo o poder corrompe”.
A alternatividade ,na verdade, nada mais seria do que o exercício de hermenêutica , da sensatez , do sentir a natureza humana, os seus anseios , seria o razoável, o proporcional , a minimizar a seletividade do sistema penal.
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