segunda-feira, 15 de novembro de 2010

FOGUEIRA DAS VAIDADES



Quando estava na Faculdade de Direito do Recife ouvia falar, em tom jocoso,sem entender as razões:“O Direito é a área que tem mais imbecil por metro quadrado”, findo o curso continuei sem entender o sentido da afirmação.

Passados alguns anos comecei a perceber que talvez a tal imbecilidade traduzia-se numa vontade incessante e insana que parte dos aplicadores do direito teriam em ser mais do que o rei.

Alguns deles, notadamente, promotores de justiça e juízes, insistem numa queda de braço, na imbecilidade de medir forças para, ao final, saber quem mandaria mais, quem é o “bambambam”, qual deles imporia a sua vontade, em suma, qual deles imbecilmente, seria mais do que o rei´.

Neste cenário verifica-se uma guerra nos bastidores, e alguns, ou melhor, muitos, entendem que qualquer alteração mínima que seja nesta ou naquela lei representaria uma perda de parcela do poder que eles pensam, em sua imbecilidade, deter.

Assim, mudanças como a reforma processual penal, notadamente, no artigo 212 e seu parágrafo único da Lei 11690/2008, se presta ao palco de um espetáculo deplorável, onde aplicadores do direito, que deveriam comprometer-se acima de tudo com os princípios constitucionais como guardiões da Constituição, se digladiam por migalhas do tal Poder, e já fora dito “Todo Poder Corrompe”.

Ora, a modificação introduzida pela reforma processual penal de 2008, ou seja, mais de dois anos, mas que parece que foi ontem, diante de muitos operadores do direito que não conseguiram digeri-la, procurou, simplesmente, assegurar o que a Carta Magna desde 1988, mais de 20 anos, já previa: a imparcialidade necessária dos magistrados. Mas, acabara transformando-se num campo fértil às batalhas inglórias.

Temos assim, que a imparcialidade, quase um ideal, posto que sempre defendemos algo, sempre somos movidos por interesses os mais diversos, neste caso se apresentaria como palpável, plenamente possível, a assegurar simplesmente a eqüidistância necessária a qualquer julgador.

Juiz deve se investir da função de juiz, de presidente do feito e não lançar mão da espada que cabe a acusação, mesmo que em nome do mais honroso ideal de Justiça. Cada aplicador do direito, em nome da segurança jurídica, deve ter seu papel devidamente delimitado, para que um não pretenda arvorar-se de substituto processual de outro, para o resguardo das Instituições envolvidas no “jogo” processual, a assegurar direitos e garantias individuais e, conseqüentemente, a assegurar todos nós.

O promotor de justiça é o titular da ação penal e fiscal da lei, representando os interesses da sociedade, o magistrado preside o feito e realiza a prestação jurisdicional, julgando, embora, obviamente, também defenda os interesses da sociedade, o que o faz de forma reflexa, enquanto que o advogado ou defensor, representa os interesses do seu constituinte.

Todas as funções apresentam os seus complicadores, e todas são IGUALMENTE necessárias e indispensáveis à prestação jurisdicional, embora cada uma, em algumas ocasiões, esperamos que em poucas, pretenda ser o centro das atenções sobrepondo-se a outra, impondo uma DESIGUALDADE que deve ser combatida.

Assim, verificamos que ao garantir a imparcialidade necessária ao magistrado e reservar a função de acusador ao Ministério Público, no caso de Ação Penal Pública, determinando que as indagações às testemunhas sejam iniciadas pelas partes e não mais pelo julgador que, ao final, entendendo restar esclarecimentos a serem feitos, passará a indagar a testemunha, o legislador, alheio a tais inúteis “guerrilhas”, abriu espaço a um verdadeiro rebú, onde parte dos magistrados é contrária à modificação, contrapondo-se à lei e, pior ainda, aos princípios constitucionais envolvidos no tema, pois parte deles temem transformar-se de protagonistas a coadjuvantes, sentimento equivocado e motivado por mera vaidade. Não sabem eles que protagonista só o povo e coadjuvantes todo o resto.

Como diz Luiz Roberto Barroso: “Constatei que a história, por vezes, anda rápido. E o impossível de ontem é o insuficiente de hoje”, portanto falta tal percepção a muitos aplicadores do direito que insistem em deitar-se em berço esplêndido, contrariando leis, o que é pior, princípios constitucionais basilares do Estado Democrático de Direito, aguardando posicionamentos e decisões do STJ e STF, jamais na vanguarda, mas sempre a reboque, a interpretar as leis em bases falsas, ou seja, a garantir suas atribuições, o seu "poder", independentemente dos princípios, não arregaçando as mangas  realizando cada um a interpretação das leis diante dos ditames constitucionais, valendo-se da hermenêutica.

Em nome de apegos nada honrosos não estamos sendo invadidos pelo necessário “sentimento constitucional” que prescindiria, inclusive, de uma lei, de algo concreto, seria, sim, uma questão de princípios, princípios de vida, uma atitude diante dela.

A atitude reinante, lamentavelmente, é a de manutenção da “ordem” mesmo que esta “ordem” seja uma verdadeira desordem, seja a manutenção de privilégios, a manutenção de parcelas equivocadas de poder, mesmo que tudo isto represente um tumulto desnecessário a tramitação processual, mesmo que contrariando interesses da sociedade, contrariando a Constituição, que deveria ser, em primazia, observada pelos aplicadores do direito.

Nos deparamos com juízes gritando insanamente, como se o respeito fosse garantido no grito, promotores que também se valem de atos insanos, mas algumas vezes da subserviência frente aos urros dos magistrados, e advogados que, por vezes, gritam, mas que muitas vezes se curvam diante dos demais, postura que, não raramente, prejudicam os seus constituintes.

Tropeçamos em promotores e juízes que se calam frente às afrontas a Constituição, quando não são os primeiros a afrontá-la sob o equívoco de uma curiosa legalidade, incompreensível diante dos princípios constitucionais.

Vemos juízes e promotores entendendo que advogados devem, em nome da regular tramitação processual, prescindir da presença de seus constituintes presos e não apresentados pelo Poder Público, não arrolar testemunhas que imponham retardos processuais, quando na verdade, a primeira situação é um direito, em observância ao princípio da ampla defesa, em razão da possibilidade dos acusados fornecerem  subsídios indispensáveis a sua defesa técnica, e a segunda é um direito que deverá ser observado pelos demais aplicadores, a evitar que testemunhas arroladas por carta precatória ou rogatória sejam um mero expediente protelatório e tal vigilância caberá aos demais, aos que defendem não este ou aquele, mas o Estado amplamente falando.

Cada um que grite mais ou se cale mais, e o demais é sobra.

Assim, nesta fogueira de vaidades, sobram os subservientes e os tiranos, os usurpadores.

Neste jogo processual o rei é a vontade popular representada pelo sentimento constitucional, por seus princípios escritos ou não.

É preciso que o sentimento constitucional invada-nos , é preciso que o respeito a cada atribuição de um aplicador do direito invada-nos, é preciso gritar menos, calar menos, curvar-se menos e agir mais, um agir cuja limitação é apenas uma : Os princípios.

Há diversas formas de arbítrio e uma delas, a afrontar a ampla defesa, o contraditório e, portanto, o devido processo legal é tentar “garfar” as atribuições de outro aplicador do direito, é tentar amordaçar os demais atores deste jogo processual, é pretender, a qualquer preço, ser o protagonista exclusivo, fazendo os demais, forçosamente, de coadjuvante, é dizer imbecilmente : eu sou ! , e nas entrelinhas dizer: Eu posso tudo ! eu mando!, posição que se traduz na célebre frase: “L’Etat c’est moi” .







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