segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A Macrocriminalidade e a Necessidade de Adequação dos Procedimentos Processuais Penais: Substituição de Testemunhas

Diante da macrocriminalidade , notadamente, nos crimes envolvendo tráfico de drogas por grupos com nuances de organização criminosa, me vi diante de um dilema quanto ao número de testemunhas a serem arroladas e substituição destas.
A questão, aprioristicamente, seria de fácil solução e estaria claramente prevista no art.54 da Lei 11343 de 2006 , que estabelece o número de até 5 (cinco) testemunhas a serem arroladas pelas partes.
Entretanto imagine-se diante de um processo altamente complexo com um número elevado de acusados, mais de 15 (quinze) , com características de organização criminosa , onde o Ministério Público , em nome da legalidade, arrolasse cinco testemunhas contra a possibilidade da defesa , da mesma forma, arrolar cada uma cinco testemunhas, mas ao total, estaríamos diante de um somatório de 75 ( setenta e cinco) testemunhas de defesa, posto que há possibilidade de cada grupo de cinco, referente a um único acusado, mencionar dados do caso e outros tantos acusados, ou seja, por parte da Defesa seriam 75 ( setenta e cinco testemunhas) contra 05 (cinco) arroladas pela acusação.
Imaginemos os processos frutos das chamadas grandes operações policiais, com alvos diversos, locais diversos de atuação, e apenas cinco testemunhas arroladas pela acusação a falarem quanto a um número elevado da acusados, 10, 15, 20 , 25 ou mais.
Nas grandes operações policiais, o elevado numero se suspeitos ou alvos impõe todo um planejamento na deflagração, na abordagem, na formação do inquérito policial, na apresentação da acusação e portanto nas testemunhas a serem arroladas pelo Órgão Ministerial.
Para a deflagração das operações se faz necessário, os chamados briefing , ou seja, um conjunto de informações, uma coleta de dados, passadas em uma reunião para o desenvolvimento de todo um trabalho de investigação, onde deve ser criado um roteiro de ação para ensejar uma melhor solução , mapeando o problema, constituindo-se em uma peça fundamental para o sucesso da investigação policial, um elemento chave para o entendimento da abordagem a ser feita .
Assim, em tal briefing os policiais são divididos em grupos visando a abordagem e cumprimentos de mandados de prisão a cada alvo (suspeito) e de busca e apreensão, e apenas tomam conhecimento de seus respectivos alvos e dados da operação pouco tempo antes da deflagração, poucas horas antes, isto a tentar evitar o vazamento de informações e prejuízos irremediáveis.
Tais operações , diante do elevado número de acusados e complexidade do tráfico que formaria uma engenhosa rede, enseja a oitiva de diversas testemunhas da associação criminosa, da prisão, da busca , enfim do que fora apreendido, da traficância em si a possibilitar as provas que a acusação apresentará na denúncia.
Quanto maior o número de suspeitos, maior o número de alvos, maior o número de acusados e consequentemente maior o número de testemunhas.Contudo, a lei de drogas determina que cada parte apresentará até cinco testemunhas e a acusação, inquestionavelmente, se vê prejudicada, pois é tarefa das mais difíceis que cinco testemunhas se prestem a informar sobre um número elevado de acusados, cuja atuação, prisão e apreensão de bens e produtos criminosos se deram de forma diversa.
Ora , por mais que o grupo criminoso seja único, que a rede ou organização criminosa seja única, são peças desta um número elevado de acusados, cujas condutas se emaranharam . Cada acusado tendo direito a cinco testemunhas, que poderão se deter, não apenas quanto ao acusado responsável pela apresentação da testemunha , mas a outros, coloca o Ministério Público em situação desigual ao final.
Como o Órgão ministerial poderá abarcar toda a acusação, todos os acusados se apenas dispõe de cinco testemunhas a falar , muitas vezes, não apenas quanto a cinco acusados, mas quanto a um número considerável deles .
Portanto, neste cenário tormentoso para o Órgão Ministerial, entendemos que o princípio da igualdade deveria ser invocado a autorizar a possibilidade de serem arroladas até oito testemunhas, em tais casos , número máximo admitido pelo Código de Processo Penal que, subsidiarimente, deverá ser buscado , quando do silêncio da Lei de drogas, mas também quando da resolução de conflitos desta natureza, a minimizar os prejuízos impostos quando da instrução dos processos criminais referentes a grupos organizados.
Quanto a possibilidade de substituição de testemunhas pelas partes, diante do silêncio da reforma processual a respeito , em razão de não mencioná-la no art. 397 do CPP , posto que a nova redação trazida pela Lei 11.719, de 20.06.2008 passou a ocupar-se da absolvição sumária, omitindo-se o legislador com relação à substituição de testemunhas, e abrindo as seguintes possibilidades: a primeira é no sentido do magistrado deferir as substituições requeridas, independentemente, de qualquer fundamento que seja. A segunda quanto à impossibilidade de substituir testemunhas. A terceira orienta a aplicação da analogia que supra a omissão do legislador.
Entendemos que as duas primeiras posições não se sustentam a mínima análise, seja pelo princípio da motivação das decisões, seja pelos prejuízos ao contraditório e a ampla defesa.
Quanto a razoável posição que faz referência à analogia. Defendemos a aplicação analógica do CPP 543 “ O juiz determinará as diligências necessárias para a restauração, observando-se o seguinte:I - caso ainda não tenha sido proferida a sentença, reinquirir-se-ão as testemunhas podendo ser substituídas as que tiverem falecido ou se encontrarem em lugar não sabido;
Temos assim, um forte motivo para socorrer as partes autorizando a substituição, como há outros: Não comparecimento ou apresentação injustificada de testemunha arrolada. Não se tratando, obviamente, de ato desleal da parte,capricho ou objetivando tumultos e retardos processuais.

Ora, a possibilidade de substituição de testemunhas deve estar presente quando elas não são localizadas, por motivo de força maior , como morte de alguma testemunha e por fim, deverá também ser possível diante de novas informações trazidas aos autos a acusação ou a defesa, bem como pelo não comparecimento justificado da testemunha.
O magistrado deverá, ainda, considerar os princípios da celeridade e economia processuais, invocando o trinômio necessidade, pertinência e utilidade, ou seja, se a solicitação pela substituição, seja por parte do Ministério Público , seja por parte da Defesa irá ou não impor prejuízos a marcha processual.
Assim, deverão ser considerados os fundamentos invocados pela parte que pretende a substituição, sendo ouvida a parte contrária, aferindo-se a necessidade e utilidade da pretensão e, por fim, a pertinência, o momento processual em que se dá a pretensão, e se a medida irá impor retardos à tramitação processual ou, ao contrário, favorecerá a celeridade e economia processuais.
Portanto, a depender dos motivos da substituição, se a parte solicitante, mesmo que na audiência de instrução e julgamento, apresenta a testemunha que efetivamente pretenda ouvir, sem que se desse a necessidade de fragmentação do ato processual ou adiamento com intimações e novas designações , entendemos ser por demais engessado não se admitir a substituição, notadamente se irá evitar retardos processuais, como se daria, caso uma testemunha arrolada na denúncia ou na defesa preliminar não comparecesse, ou não fosse apresentada e houvesse insistência da parte o que ensejaria uma nova audiência em continuação.
Há ainda a curiosa situação de designações da audiência de instrução e julgamento para mais de um dia, devido, justamente, a alta complexidade do processo pelo caso apresentado e pessoas a serem ouvidas, em que todas as partes, acusados e testemunhas necessitariam estar presentes todos os dias, independentemente que esta ou aquela pessoa fosse efetivamente ouvida neste ou naquele dia, o que, em geral ocorre nos processos frutos de grandes operações e com elevado número de acusados.
Ora, em tais casos todos estariam intimados, salvo expressa determinação do juízo em contrário, a todos os dias, constituindo-se, na verdade, num único ato processual que se estenderia por diversos dias. Assim, estando no momento de ser tomada as declarações desta ou daquela testemunha e do não comparecimento ou não apresentação injustificada, com a parte solicitando, não a insistência a impor todo um retardo processual , mas sim a substituição por pessoa que estaria pronta para ser ouvida naquele momento , a impor o devido prosseguimento do feito, não vemos como tal substituição possa ser rechaçada, principalmente , se tal testemunha , embora não arrolada pela limitação do número, consta dos autos , assinando determinado relatório, participando de alguma diligência ou de serviço de inteligência, sequer a surpresa poderá ser alegada por parte de quem quer que seja.
O que não se deve conceber é que as partes não possam expor seus fundamentos, que estes fundamentos não sejam sopesados pelo magistrado e que este não decida motivadamente, ou seja, enfrentando as teses apresentadas pela defesa e pela acusação, obviamente, no momento em que forem feitas as solicitações, na própria audiência de instrução a evitar retardos indevidos e tumultos a tramitação processual.
Enfim, deverão ser considerados os princípios do devido processo legal, contraditório, ampla defesa, motivação das decisões judiciais, celeridade e economia processuais.




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